O Concílio Vaticano II: testemunho de Yves Congar


Dia de São Pedro e São Paulo | 29 de junho de 2023


Neste dia de São Pedro e São Paulo, parece-me oportuno apresentar aqui, brevemente, uma obra que nos deixou Yves Congar (1904-1995). Trata-se, na realidade, de um quase diário, onde o padre Congar regista pensamentos, esperanças e desilusões que lhe ocorrem no tempo em que participa, ativamente, no Concílio Ecuménico Vaticano II (inaugurado a 11 de outubro de 1962, pelo Papa João XXIII; e encerrado a 8 de dezembro de 1965, já pelo Papa Paulo VI).

Proeminente teólogo do século XX – defensor da “Nouvelle Theologie” (Nova Teologia) – Yves Congar preocupa-se seriamente, no seu tempo, com a renovação eclesial; ficando, contudo, sempre fiel à Igreja de Roma e às raízes históricas da Instituição. Uma fidelidade, porém, nem sempre devidamente reconhecida, ao longo de sua existência atribulada, que finda aos 91 anos de idade, em Paris. Em 1994, um ano antes da sua morte, o Papa João Paulo II nomeia-o cardeal. Congar encontra-se gravemente doente e, impossibilitado de viajar até Roma, recebe as insígnias cardinalícias na cama. É uma tentativa simbólica de reposição de justiça. Efetivamente, é a padre Congar – enquanto Peritus (conselheiro) no Concílio Vaticano II – que nós devemos preciosos estímulos que contribuíram para a elaboração de documentos conciliares tão significativos como a Constituição Pastoral “Gaudium et Spes”, sobre a Igreja no mundo de hoje; ou a Declaração “Dignitatis Humanae”, sobre a liberdade religiosa.


CONGAR, Yves M.-J., o.p. – Vatican II : Le Concile au jour le  jour. I-IV. Paris : Éditions du Cerf, 1963-1966.


Esta obra do padre Congar, em quatro volumes, afigura-se-nos como um testemunho de presença diária e participante naquele que ele próprio considerou o acontecimento mais importante da vida da Igreja no século XX (cf. II, 85): o Concílio Ecuménico Vaticano II.

Convocado por João XXIII (cf. I, 9) e reaberto por Paulo VI (cf. II, 84), nele ficou impregnada a personalidade de dois homens de cariz bem diferente (cf. II, 43-45; 53) e, no entanto, aproximando-se em ideais cristãos, que ambos desejavam ver realizados numa Igreja que pretende abrir-se ao mundo e dialogar com os homens (cf. I, 39; 85-86; 91; IV, 131; 145).

É um caminho percorrido, em conjunto, pelos padres conciliares em união com o Santo Padre (cf. III, 118), por teólogos (cf. IV, 123), exegetas (cf. IV, 125), historiadores (cf. IV, 140-141) e leigos (cf. II, 78); vivido como uma celebração (cf. I, 20); e não isento de dificuldades (cf. I, 33; 58; 69; 78; II, 117; III, 19). Ao longo dele, a Igreja vai tomando consciência do carácter corporativo e colegial da sua vida profunda (cf. I, 17; II, 22; III, 48; 118); assim como das suas limitações humanas, frente a problemas de organização interna (cf. I, 47-53; II, 98-99; 130-131; IV, 70) e a uma necessidade urgente de renovação das suas próprias estruturas (cf. II, 47-50; 95-96; 127; 129; 141; III, 135-136; IV, 33).

Num tempo marcado pelo desenvolvimento das ciências humanas e pela luta de classes, a Igreja escuta “o sinal” (cf. III, 70; 83-84) e faz uma tentativa séria para lhe dar uma resposta satisfatória. Começando pela renovação litúrgica (cf. II, 156-157; III, 93-94; IV, 69), descobre a sua natureza escatológica (cf. III, 31; IV, 134), e tenta esboçar uma antropologia cristã (cf. IV, 35; 75-76; 105-107; 111-112; 139).

Com o Vaticano II, abrem-se perspetivas de ecumenismo (cf. II, 103; III, 71-72) que, mesmo ainda incompletas (cf. III, 16-17; 34; 120-122), fazem nascer a esperança de uma realização futura (cf. IV, 148). Processo difícil e lento, é certo, mas não impossível.


Fernanda Alves Afonso Grieben

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Sou pintora, originária do Norte de Portugal, mas resido atualmente na Alemanha. Também gosto de escrever textos literários, sobretudo para a infância. Faço-o, principalmente, para mim própria. No entanto, alegro-me sempre que encontro uma possibilidade de partilhar a minha escrita com as demais crianças, de todas as idades. Sou Mestre em Teologia (UCP); Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas – variante de Estudos Portugueses e Doutorada em Estudos Portugueses, na especialidade de Literatura Portuguesa (UAb).

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