Ginkgo Biloba (V)


EU SOU a árvore que Goethe cantou


Um mundo invisível


Sob o ponto de vista das condições climatéricas, a estufa onde agora vivíamos parecia perfeita. Um horticultor, que nos visitava diariamente, não só nos dava água e sais minerais em quantidades suficientes, como também nos dirigia sempre algumas palavras agradáveis de ouvir, ainda que nunca se tenha apercebido de que o entendíamos.

Contudo, para me ter desenvolvido da forma que seria natural para uma árvore da minha idade, e da minha espécie, eu teria precisado de muito mais.Teria precisado de receber os raios solares diretamente nas minhas folhas, sem que a sua intensidade e pureza tivesse sido antes quebrada pelas janelas de vidro da nossa prisão… Assim como também teria precisado de sentir as minhas folhas a bailar suavemente, embaladas pelo vento… Enfim, se tentasse fazer uma lista mental de tudo o que me faltou, nesses anos tão importantes da minha vida, penso que não mais acabaria…


© MarinoDenisenko – stock.adobe.com

As plantas que tinham nascido na estufa, porém, não sentiam como eu. Para elas, aquele era o seu mundo. Tinham-se conformado com a sua realidade e consideravam-se felizes por não precisarem de lutar para sobreviver. Desconheciam tanto os gelos dos invernos como os intensos calores dos verões. E como nunca tinham vivido em liberdade, também não podiam sentir a falta do ar fresco… Ou a falta da água da chuva a escorrer pelas suas folhas, infiltrar-se na terra e chegar até às suas raízes. Ninguém sente a falta do que nunca teve. Por isso, para elas, eu era uma ingrata que não sabia dar verdadeiro valor ao conforto em que vivia.


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Nunca, como nesse tempo, eu senti tão forte a necessidade de ter uma Amiga, ou um Amigo. Alguém que me compreendesse, sem me julgar. Alguém com quem pudesse falar abertamente, acerca de tudo.


Comecei então a entender melhor as palavras da aragem, quando me disse que não há mistério maior que o da procura. Eu tinha começado a procurar no interior do meu ser um outro eu. Ele seria para mim o tu que não existia no meio que me rodeava, e onde eu estava obrigada a permanecer. E pude sentir o mistério… Sim, o mistério da existência de um mundo materialmente invisível, mas real para a minha alma de árvore!

Era o mundo da minha sensibilidade interior. Que não era só meu, por certo. Pois estava convencida de que, nesse mesmo planeta onde habitava, também existiam outros seres vivos que o sentiam e viviam, tal como eu.

A esperança ficou em mim, e não mais saiu. A esperança de encontrar um dia a ligação entre esses dois mundos, o visível e o invisível, para deles fazer um único – um mundo que queria partilhar com todos os seres vivos!


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Se me tivesse sido possível contar isto à minha avó, ela ter-me-ia certamente desiludido. Para ela, o que não fosse visível era somente fruto da fantasia, sem qualquer fundamento… E se pensarmos que a minha avó já era uma árvore centenária, então fica no ar a pergunta: “O que tinha ela aprendido realmente com a vida, para além dos seus provérbios, ao longo de todos esses anos?”.

De uma coisa eu tinha a certeza: dessa forma, eu não queria viver!


Aos poucos, fui intensificando o diálogo com as outras árvores da minha espécie. Nenhuma delas percecionava a vida da mesma forma que eu, no entanto, todas elas me compreendiam melhor do que as restantes plantas. Porque também elas tinham conhecido uma forma diferente de viver. E essa experiência foi gratificante para ambas as partes. À medida que nos fomos conhecendo melhor, as dificuldades que ao princípio surgiram, por analisarmos a nossa vida de perspetivas diferentes, foram desaparecendo, e nós tornámo-nos Amigas.


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Com o brotar de uma Amizade entre duas árvores, surge sempre um elo que as une e fortifica. Assim também foi connosco.

A Amizade que nesses anos nos uniu ajudou-nos a crescer e tornou-nos mais fortes. De tal forma que, de pequenas árvores, débeis e inseguras, tornámo-nos em árvores robustas e resistentes. Não só fisicamente, como mentalmente. Por isso, um dia, olhando para nós e admirando-nos, o horticultor decidiu que era chegado o tempo de nos libertar…


Fernanda Alves Afonso Grieben

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Sou pintora, originária do Norte de Portugal, mas resido atualmente na Alemanha. Também gosto de escrever textos literários, sobretudo para a infância. Faço-o, principalmente, para mim própria. No entanto, alegro-me sempre que encontro uma possibilidade de partilhar a minha escrita com as demais crianças, de todas as idades. Sou Mestre em Teologia (UCP); Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas – variante de Estudos Portugueses e Doutorada em Estudos Portugueses, na especialidade de Literatura Portuguesa (UAb).

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